Escrito por Fábio Willians
Quinta, 07 Janeiro 2021 14:16
“Nós chegamos no limite da Covid”. Com essa frase e um olhar lúgubre, o prefeito Alexandre Kalil (PSD) comunicou que, pela terceira vez durante a pandemia, o comércio não-essencial de Belo Horizonte vai ter que baixar as portas - e sem previsão oficial de retorno.
Além do comércio essencial, também poderão funcionar somente as praças públicas e o zoológico. A decisão, unânime, foi tomada após reunião realizada com o Comitê Municipal de Enfrentamento à Covid-19. A medida vale a partir da próxima segunda-feira (11), e detalhes serão informados em decreto a ser publicado na sexta (8). A expectativa é que as restrições durem cerca de três semanas, mas o cenário é incerto.
O avanço galopante dos índices de ocupação de leitos na cidade foi o principal item que motivou o prefeito a tomar a medida. Somente nesta semana, a ocupação de UTIs para Covid passou de 80,5% (no dia 4) para os 86,1% desta quarta-feira. “A ocupação chegou em um ponto insustentável. Pode morrer gente sem médico e sem respirador”, informou Estevão Urbano, infectologista que integra o comitê de enfrentamento à Covid. A prefeitura não deve autorizar o funcionamento do comércio até que esse índice saia do nível vermelho e chegue ao patamar de 70% de ocupação.
Mas esse índice não foi o único que balizou o aperto nas regras. O esgotamento das equipes médicas também influenciou a medida. Uma das estratégias da prefeitura para mitigar o avanço das mortes por Covid tem sido a criação de novos leitos, mas atualmente a Secretaria Municipal de Saúde sofre dificuldades na contratação de médicos especializados em tratamentos intensivos, dedicados a pacientes com quadros graves. Os profissionais estão se desdobrando em trabalhar horas a mais, algo igualmente insuficiente. “Os médicos estão esgotados. Não tem (mais) médico capacitado para trabalhar. O treinamento exigido é muito demorado. Não tem como arregimentar mais médicos, nem que se queira. É uma questão de recursos humanos”, desabafou Urbano.
Impacto do Réveillon pode piorar o cenário
Além disso, a rede de saúde, tanto a particular quanto a pública, está perto do seu limite de capacidade. Mas os especialistas avaliam que a demanda por atendimento vai continuar nessa tendência de subida, já que o reflexo atual é fruto ainda das festas natalinas. “Estava na cara que as pessoas que fizessem festas e viajassem (na virada de ano) deixariam os números insustentáveis. O impacto do réveillon ainda não aconteceu. Será visto a partir deste fim-de-semana”, calculou o especialista.
A prefeitura irá revelar detalhes das restrições na sexta-feira (8), mas é provável que os termos sejam os mesmo do decreto que fechou o comércio no início da pandemia. Naquela época, tinham permissão para funcionar somente estabelecimentos essenciais, como supermercados, padarias, farmácias, açougues, postos de combustível, agências bancárias e lotéricas, entre outros. Shoppings, clubes, estádios, bares, restaurantes e lojas devem ficar proibidos de funcionar, bem como academias e parques de lazer.
“Peço desculpas, mas não tive outra alternativa”, disse prefeito
Belo Horizonte foi a primeira capital do Brasil a fechar o comércio, em 18 de março de 2020, para conter a Covid-19. Depois de 135 dias fechada, a capital foi reaberta parcialmente a partir de 31 de julho do ano passado, quando o prefeito começou a editar decretos que permitiram setores do comércio a voltarem gradualmente.
Diante desse histórico, a alternativa de fechar o comércio agora visa conter a disseminação atual do vírus, e principalmente bloquear o aumento de casos graves. Assim, quando os infectados na virada do ano chegarem aos hospitais, a rede de saúde esteja menos congestionada. “São números impressionantes”, avaliou Kalil, a respeito dos índices atuais de ocupação de leitos.
A pressão sobre a rede de saúde tem atingido tanto casos mais graves quanto aqueles que demandam menos atenção, e isso amplia ainda mais a complexidade do caos que se encaminha. Atualmente há mais pacientes com Covid internados em UTIs privadas (252) do que no SUS (217).
Toda essa engenharia que envolve criação de leitos, restrições no comércio e contratação de mão-de-obra especializada, tem como objetivo diminuir ao máximo também o impacto do fechamento no comércio e na vida do belo-horizontino. “Foi esperado o (prazo) máximo possível para não prejudicar outros setores”, pontuou Urbano.
Nem mesmo a criação de leitos tem sido suficiente para dar conta de tanta gente infectada. Somente nesta semana, a cidade já abriu 112 novos leitos para Covid, segundo dados do boletim epidemiológico desta quarta (6), sendo 36 para enfermaria SUS, além dos destinados à rede particular (62 de enfermaria e 14 de UTI). No comunicado de ontem, Kalil informou a criação de outros 46 leitos. A previsão é que outros mais ainda sejam abertos. “Mesmo assim a ocupação ficou alta”, observou o infectologista.
O aperto nas regras de funcionamento do comércio deve-se ao fato de que a proibição de venda de álcool nos bares e restaurantes não tem sido suficiente para conter o aumento no número de infectados, conforme explica Urbano. “A partir do momento que os números vão piorando, temos que atuar nos locais de menor transmissão, como comércio, shopping, academia e clube. Não temos mais muita abertura e espaço dentro dos hospitais. Qualquer ganho que tiver, mesmo em situações de menor transmissão, é um ganho importante”, observa.
No comunicado sobre a decisão do novo decreto, Kalil informou que lamenta que a cidade tenha que ser fechada novamente. “Peço desculpas, mas não tive outra alternativa. Me desculpem, mas governar não é agradar”, disse.
FONTE: O Tempo
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