Escrito por Fábio Willians
Segunda, 11 Junho 2018 11:53
Se o Brasil não tivesse deixado de lado os investimentos em ferrovias, a greve dos caminhoneiros, que aconteceu no fim do mês passado, provocando desabastecimento em todo país, poderia ter impactos menores, conforme especialistas na área de logística. “O nosso maior problema é que não temos um modal competindo e complementando o outro, como ocorre em outros países de dimensões continentais”, observa o professor da Fundação Dom Cabral (FDC) Paulo Renato de Sousa. Conforme o levantamento Projeto Brasil, do Instituto de Engenharia (IE), 67% do transporte de carga é feito por meio das rodovias. “Foi uma opção feita pelo Estado brasileiro na década de 50”, ressalta o presidente da entidade, Eduardo Lafraia. Já a Fundação Dom Cabral estima que 75% da produção do país seja escoada pelas estradas do país inteiro.
Não bastasse a concentração da matriz do transporte de cargas, os quilômetros de estradas de ferro utilizadas foram reduzindo com o passar dos anos, tanto no Brasil como em Minas, segundo o membro da ONG Trem André Tenuta. “Na década de 60, o país chegou a ter quase 40 mil km de estradas de ferro. Hoje, não chega a 30 mil km”, diz. Uma queda de 25%. No Estado, em 1961, eram 8.451 km de ferrovia. A partir de 1996, caiu para 5.850 km.
Tenuta, que também é presidente do Instituto Cidades, explica que o déficit da malha ferroviária brasileira cresceu devido a diversos fatores, entre eles o uso político das ferrovias a partir do fim da década de 40. “A administração não era técnica, prevalecia o filhotismo, as despesas com pessoal cresciam. Isso tudo ocasionou uma ineficiência administrativa”, diz.
Na década de 80, houve uma tentativa de resolver os problemas financeiros da chamada Rede Ferroviária Federal, que incluiu a redução de pessoal. Em 1996, a malha foi privatizada por meio de concessões. A mineradora Vale foi uma das principais concessionárias. “Como a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) só foi criada em 2001, houve um período sem regulação”, diz.
Nas mãos de grandes empresas exportadoras, a malha não cresceu. “É um modelo de ferrovia que não funciona para servir o país. É um negócio de empresa”, observa Tenuta.
E se não bastasse a retração do tamanho da malha, nem todos os 29.075 km concedidos para a iniciativa privada estão em condições de serem usados, conforme levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI). São 8.600 km, o equivalente a 31% do total da malha abandonados. E 23% (6.500 km) são de trechos considerados sem condições operacionais. Para a entidade, a ausência de concorrência contribuiu para a ineficiência do sistema.
Investimentos. A Fundação Dom Cabral calcula que seja necessário investir, pelo menos, R$ 600 bilhões nos próximos 15 anos em logística no país.
Despesas. Os custos logísticos consomem 12,37% das receitas das empresas.
Prioridade. O Instituto de Engenharia recomenda priorizar os investimentos na Ferrovia Norte-Sul.
Investimento para ampliar malha é nulo
A antecipação da concessão da malha ferroviária brasileira, que vence daqui a dez anos, é uma medida que causa polêmica. O membro da ONG Trem André Tenuta é contra. Para ele, é arriscado manter as estradas de ferro nas mãos de grandes empresas exportadoras. “Elas têm interesse em manter apenas os corredores para exportação. Logo, não atendem o interesse público”, analisa.
Conforme levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI), no intervalo de 2006 a 2013, somente 7,6% (US$ 62 milhões) dos recursos investidos no setor ferroviário foram destinados à ampliação da malha, excluídos os recursos para a Nova Transnordestina.
Para o especialista em políticas e indústria da CNI, Matheus de Castro, a antecipação é uma oportunidade para corrigir erros cometidos nos anos 90, incluindo novos investimentos nos contratos e incorporando o compartilhamento das malhas.
Tenuta frisa que não há como garantir que os investimentos sejam feitos por essas empresas. “Com a antecipação, as ferrovias ficariam com essas empresas por 40 anos”, diz. Para ele, é possível aproveitar o que já existe e reativar as linhas mais curtas. “Se o país tivesse os quase 40 mil quilômetros de linhas que já teve no passado, já seria um bom começo”, diz.
FONTE: Juliana Gontijo / otempo.com.br
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