Aécio Neves vira réu no Supremo por corrupção e obstrução de Justiça

Ministros da Primeira Turma acolheram denúncia da Procuradoria Geral da República contra senador tucano – por 5 a 0 em relação à acusação de corrupção passiva e por 4 a 1 à de obstrução de Justiça.




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Terça, 17 Abril 2018 17:21

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta terça-feira (17) receber a denúncia contra o senador Aécio Neves (PSDB-MG) por suposta prática de corrupção passiva e obstrução de Justiça. Com isso, o senador será transformado em réu pela primeira vez.

Por unanimidade, os cinco ministros da turma (Marco Aurélio Mello, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Rosa Weber e Alexandre de Moraes) admitiram a abertura de processo por corrupção e, por 4 votos a 1, por obstrução de Justiça – neste caso, o único voto contrário foi o de Alexandre de Moraes.

Com a aceitação da denúncia, Aécio passa a responder ao processo penal na condição de réu e poderá contestar a acusação com novas provas. Só ao final da ação poderá ser considerado culpado ou inocente, em julgamento a ser realizado pela mesma turma do Supremo. Terminado o julgamento, o senador afirmou que provará a 'absoluta legalidade e correção' de seus atos.

Junto com o parlamentar, foram denunciados pela PGR e também responderão como réus a irmã dele, Andréa Neves da Cunha, o primo Frederico Pacheco de Medeiros e Mendherson Souza Lima, ex-assessor parlamentar do senador Zezé Perrela (MDB-MG), todos por corrupção.

Aécio foi acusado em junho do ano passado, em denúncia da Procuradoria Geral da República, de pedir propina de R$ 2 milhões ao empresário Joesley Batista, dono da J&F, em troca de favores políticos; e também de tentar atrapalhar o andamento da Operação Lava Jato. Uma conversa entre os dois foi gravada pelo empresário. Andréa Neves teria pedido o dinheiro a Joesley e os outros dois acusados teriam recebido e guardado quatro parcelas de R$ 500 mil em espécie.

O julgamento começou no início da tarde com as manifestações da acusação e da defesa do parlamentar. O advogado de Aécio, Alberto Zacharias Toron, contestou as acusações de corrupção e obstrução de Justiça. O subprocurador da República Carlos Alberto Coelho, responsável pela acusação, disse haver “farto material probatório” para incriminar o senador.

Após as manifestações da procuradoria e dos advogados, os ministros rejeitaram, por unanimidade, um pedido da defesa para ter acesso a provas que integram outras investigações, relacionadas a Marcello Miller.

Depois, negaram o fatiamento do caso para enviar à primeira instância as acusações contra Andréa, Frederico e Mendherson, por não terem foro privilegiado. Dos cinco ministros da Primeira Turma, quatro entenderam que as condutas estavam imbricadas, de modo que não seria conveniente separar os processos. O único a votar pelo desmembramento foi o relator, Marco Aurélio Mello.

Os ministros também rejeitaram de modo unânime uma contestação à validade das provas usadas na investigação. A defesa sustentou que foram baseadas na delação da J&F, alvo de questionamento pela suposta orientação do ex-procurador Marcello Miller aos executivos da empresa, quando ainda integrava a PGR.

Os ministros negaram o pedido, considerando que a validade do acordo e a manutenção ou não das provas será analisada em momento posterior, em ação própria.

Votos dos ministros
Relator do inquérito no STF e responsável por supervisionar as investigações, Marco Aurélio Mello disse em seu voto que as suspeitas de corrupção e obstrução serão analisados com mais profundidade durante o processo, no qual a defesa poderá contestar novamente as acusações com mais provas.

O ministro considerou que não configuram obstrução de Justiça a atuação de Aécio Neves na discussão de projetos de lei – para aprovar novas formas de abuso de autoridade e perdoar prática de caixa 2.

“A articulação política é inerente ao presidencialismo de coalisão, e não pode ser criminalizada, sob pena de ofensa a imunidade material dos parlamentares, nesse ponto, mostra-se insuficiente o que veiculado na peça acusatória”, disse o ministro.

Em outra parte do voto, porém, Marco Aurélio viu tentativa de embaraço às investigações na pressão exercida sobre membros do governo e Polícia Federal para escolher delegados para conduzir os inquéritos da Operação Lava Jato.

“Ocorre que há transcrições de conversas telefônicas ligações realizadas pelo senador das quais se extrai que estaria tentando influenciar na escolha de delegados da Polícia Federal em inquéritos alusivos a Operação Lava Jato [...] Surgem sinais de pratica criminosa”, disse.

Segundo a votar, Luís Roberto Barroso considerou que os indícios de corrupção são mais sólidos que os de obstrução, mas viu indícios para receber a denúncia pelos dois crimes. "Acompanho o ministro relator e penso que claramente houve a utilização do cargo de senador para a pratica de crime”, disse o ministro.

No voto, ele também disse que recomendaria a suspensão do mandato – disse que desistiu por causa da decisão do plenário do STF no ano passado que condicionou tal medida a aprovação do Senado. “Como não há fato novo, em respeito a separação de poderes, não estou encaminhando nesse sentido”, disse Barroso.

A ministra Rosa Weber também votou pela abertura da ação penal, considerando que são suficientes, nessa fase, somente indícios da prática de crimes.

“Especificamente quanto à obstrução de Justiça, pela vertente da tentativa da escolha de delegados de Polícia Federal para conduzir os inquéritos da Operação Lava Jato”, disse. Segundo a ministra, tal atuação não seria uma atividade legislativa.

Luiz Fux disse ao votar que, na fase de recebimento da denúncia, eventuais dúvidas não devem favorecer o investigado, mas a sociedade, na busca pela elucidação dos fatos. Ela afirmou que a denúncia da PGR apresenta maior verossimilhança que as versões apresentadas pela defesa.

“É caso típico de recebimento de denúncia, em cujo processo a parte poderá demonstrar à sociedade a verossimilhança de que se tratava de um empréstimo, porque não sabia o que estava levando para o imputado, e que também não tinha ciência, consciência do fato, por isso agiu sem qualquer dolo”, afirmou.

Acusação
Representando a Procuradoria Geral da República (PGR), responsável pela acusação, o subprocurador da República Carlos Alberto Coelho disse haver “farto material probatório” no caso e que por isso, a defesa se concentrou, segundo ele, em apontar nulidades jurídicas na investigação.

Coelho lembrou, contudo, que a investigação conta com gravações da Polícia Federal do primo de Aécio, Frederico Pacheco de Medeiros, recebendo dinheiro do diretor da JBS Ricardo Saud, entre março e abril do ano passado, a mando de Joesley Batista, conforme combinado previamente com o senador.

Em relação à acusação de corrupção, o subprocurador disse que Joesley aceitou dar R$ 2 milhões a Aécio em razão de seu cargo.

“Não há dúvidas de que o empresário apenas aceitou pagar R$ 2 milhões a Aécio Neves porque esse ocupava o cargo de senador da República. Os autos deixam claro que não fez o pagamento por prodigalidade, altruísmo ou solidariedade. Sabia que Aécio estava pronto para prestar contrapartidas”, disse Coelho.

O subprocurador também contestou a tese da defesa de que Joesley teria sido induzido pela PGR a forjar um crime do senador, a partir da orientação do ex-procurador Marcello Miller.

“Não houve em sua execução [gravação da conversa] qualquer participação do MP ou da PF. Foi realizada inteiramente pelo colaborador por iniciativa sua e posteriormente entregue à PGR”.

Defesa de Aécio
Pela defesa de Aécio, o advogado Alberto Zacharias Toron começou contestando a acusação de obstrução de Justiça, sob o argumento de que o crime envolve impedir investigação sobre organização criminosa.

“Não se trata de acusação de organização criminosa e não há notícia relativamente à prática de estar inserido em organização criminosa”, disse o advogado.

Toron ainda contestou a acusação de que Aécio teria tentado obstruir a Justiça na discussão de projeto de lei contra o abuso de autoridade. Disse que, na tramitação do texto, o senador propôs eliminar o chamado “crime de hermenêutica”, pelo qual um juiz poderia ser punido por decisão posteriormente derrubada por instância superior.

“Ele teve condutas claras no sentido do pleito da Ajufe [associação dos juízes federais]. Como se dizer que essa conduta significou embaraço? Ainda que assim não fosse, isso se insere na atividade parlamentar dele”, afirmou o advogado.

Toron também buscou explicar acusação de que Aécio tentou escolher delegados para conduzir investigações da Operação Lava Jato. Disse que numa ligação com o então diretor da Polícia Federal, Leandro Daiello, ele apenas demonstrou insatisfação com o andamento de inquérito. “Manifesta contrariedade com delegados e não passou disso”.

Em relação à acusação de corrupção, disse que o crime deve estar atrelado a um “ato de ofício”.

Segundo o advogado, a denúncia fez “cortina de fumaça” ao não demonstrar uma contrapartida concreta de Aécio em favor de Joesley.

“É ele [Joesley] que sugere pagamento em dinheiro. É ele Joesley que fala na questão da Vale”, disse o advogado.

Toron reafirmou que o pedido de dinheiro a Joesley partiu de Andréa Neves, irmã de Aécio, para pagar advogados – a intenção inicial era vender um apartamento da mãe do senador ao empresário.

Defesa de Andréa Neves
Defensor de Andréa Neves, o advogado Marcelo Leonardo contestou a validade de interceptações no celular dela, pelo qual pediu dinheiro a Joesley e marcou encontro do empresário com Aécio. Disse que não havia autorização para o grampo.

Marcelo Leonardo também atacou a validade da delação da J&F pela suposta participação do então procurador Marcelo Miller nas negociações pelo lado dos executivos, citando documentos da própria PGR que levaram à rescisão do acordo de colaboração.

“A prova daí resultante é ilícita pela participação indevida de um membro do Ministério Público que atuava dos dois lados [...] Está evidente que desde o início houve o direcionamento para que houvesse a entrega do senador Aécio”, disse o advogado.

Ele também reafirmou a versão de que Andréa procurou Joesley para vender um apartamento da mãe. “Quando se pega a conversa de Aécio com Joesley ambos fazem referência ao apartamento. Fica evidenciado que a conversa foi exclusivamente à venda do apartamento e não há nenhuma gravação de que Andréa tivesse feito pedido de R$ 2 milhões”.

Defesa do primo de Aécio
Em nome de Frederico Medeiros, primo de Aécio, Ricardo Silveira de Mello disse que a participação dele se limitou à busca do dinheiro, sem conhecimento de que seria propina. “Em momento algum há referência a participação de Frederico na solicitação daquela vantagem”, disse. Acrescentou que Aécio disse a Frederico que se tratava de um empréstimo.

O advogado também citou declaração de Aécio isentando o primo de responsabilidade no episódio. “O simples fato de receber o numerário por si só não constitui ilícito penal”, disse.

Defesa de Mendherson Souza Lima
Representando o ex-assessor parlamentar Mendherson Souza Lima, que guardou o dinheiro destinado a Aécio, Antonio Velloso Neto defendeu o fatiamento da denúncia e envio da parte relativa ao cliente para a primeira instância, pelo fato de não ter foro privilegiado.

Em relação à acusação de corrupção, o advogado disse que ele não participou do pedido de propina.

“Nada foi imputado que pudesse trazê-lo a essa relação [...] Onde o dolo, onde sua participação? MP não descreve a participação [na solicitação de vantagem indevida]”, disse.

FONTE: Por Renan Ramalho e Gustavo Garcia, G1, Brasília


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